Capivara Criminal 232h40

Empresário é indiciado por compartilhar nude de deputada federal 2u5n37

Empresário de Campo Grande compartilhou foto íntima da deputada federal Camila Jara e foi indiciado pela Deam em crime com pena de até cinco anos de reclusão 73i2i

Um empresário de Campo Grande, de 45 anos, foi indiciado pela Deam (Delegacia de Atendimento à Mulher) por ter compartilhado uma foto íntima, o popular “nude”, da deputada federal Camila Jara (PT), fato ocorrido em novembro de 2022.

Desde 2018, fazer o que ele fez é crime, ível de pena de até cinco anos de reclusão. O nome dele não será identificado nesse texto por se tratar de processo correndo no máximo segredo de justiça.

Ilustração sobre crimes cometidos com o celular
Ilustração alerta sobre crimes que podem ser cometidos com uso do celular. (Foto: inteligência artificial)

A Capivara Criminal descobriu que o homem usava um telefone em nome da esposa, em um plano familiar. Nessa linha, recebeu a foto da deputada de 28 anos em um grupo de amigos, e reou a outro grupo de frequentadores de um tradicional clube da cidade, formado essencialmente por homens.

Para chegar até o indiciado, a polícia rastreou o número de telefone e chamou a titular para prestar depoimento. Só na delegacia, ela soube que o motivo era o compartilhamento da foto de uma mulher nua, no caso a parlamentar.

A partir daí, o empresário ou a ser o investigado. Em seu depoimento na Deam, ele confirmou que recebeu a imagem e acabou enviando a grupo do aplicativo de mensagens instantâneas.

Outros números também foram investigados, porém não se chegou a um responsável efetivo. A Capivara Criminal identificou que, por serem telefones chamados no jargão policial de “bombinha”, mesmo as autoridades de segurança têm dificuldade de chegar até o usuário de fato da conta.

Esses números, comuns entre criminosos, ou mesmo pessoas que querem ter contatos escondidos, normalmente são em nomes de terceiros, ou ainda desativados antes que possam ser descobertos.

A origem h5014

A imagem foi postada, inicialmente, no perfil de Camila no Instagram. Segundo a explicação dada, era um registro para uma análise nutricional, que nem deveria ter sido postado. Ficou perto de meia hora no ar e foi retirado. Na velocidade da internet, deu tempo suficiente para ganhar as redes sociais por meio de prints.

A deputada falou do assunto uma única vez, em postagem nas redes sociais e em uma nota à imprensa, como você vai ler mais abaixo.

Na época, sua assessoria jurídica disse que, além do ilícito de compartilhar foto íntima sem autorização, o fato configurava também violência política de gênero. O entendimento apresentado era de que pessoas com pensamento político diverso da petista estavam usando a imagem para atingi-la negativamente.

Camila, então vereadora, tinha acabado de se eleger deputada federal.

Durante o andamento do inquérito, a Deam entendeu diferente. O caso foi enquadrado no artigo 218 C do Código Penal Brasileiro, acrescentado em 2018, como forma de criminalizar comportamentos como a pornografia de revanche, disseminados pelos novos recursos tecnológicos.

Esse termo traduz situações em que ex-namorados, por exemplo, divulgam “nudes” ou cenas íntimas, após o fim do relacionamento. Quem reencaminha mídias do tipo também ou a correr o risco de ser culpabilizado, como ocorreu com o empresário campo-grandense.

À polícia, o investigado disse não saber que quem estava na foto era a parlamentar federal.

Em contato com o advogado representante do empresário, Alexandre Padilhas, essa informação foi reforçada.

“Muito embora o inquérito tramite em sigilo, meu cliente vem se manifestar, dizendo que confessou na delegacia ter recebido a imagem em um grupo de amigos e posteriormente a encaminhado a outro grupo. Esclareceu que não tinha conhecimento de que a pessoa na imagem se tratava da deputada Camila Jara, deixando claro que não possui nenhum vínculo político partidário com qualquer agremiação.”

Advogado Alexandre Padilhas
Advogado Alexandre Padilhas
O advogado Alexandre Padilhas, que representa o empresário indiciado pela Deam. (Foto: Gustavo Arakaki)

No comunicado, o empresário também pede perdão à vítima do crime.

“Por fim, pede as mais sinceras desculpas à parlamentar e ratifica nunca ter tido a intenção de causar qualquer problema ou constrangimento a ela.”

Advogado Alexandre Padilhas

De acordo com o que foi levantado pela Capivara Criminal, o inquérito foi relatado à 2ª Vara Criminal em Campo Grande, em 16 de novembro. No dia 29 de novembro, o promotor responsável por decidir se vai ou não denunciar o empresário pelo crime entendeu serem necessárias diligências complementares, solicitadas à delegacia.

Só quando esse requerimento for cumprido, haverá um desfecho. O promotor pode entender que não há provas suficientes, ou o contrário, defender a abertura de processo penal contra o indiciado. Se for esse o caso, a peça vai para análise do juiz titular da 2ª Vara Criminal.

Depois de o caso envolvendo a parlamentar vir à tona, a Deam divulgou que havia outros 17 inquéritos sobre situações semelhantes. Todos correm em sigilo e não foi possível saber quantos foram concluídos.

Leia mais 6p1262

  1. Deam investiga 18 casos de compartilhamento de nudes em Campo Grande 5w411o

  2. Vereadora eleita deputada enfrenta compartilhamento criminoso de nude 1y3o1m

Entenda o crime 486e2r

Derivada de um projeto de 2016, a mudança na lei que tornou infração penal a divulgação de fotos íntimas sem autorização aconteceu no mesmo pacote no qual foi criado o crime de importunação sexual. A sanção foi em 2018, com a inclusão do artigo 218 C no capítulo dedicado aos crimes contra a dignidade sexual do Código Penal.

Confira o texto do artigo:

  • Art. 218-C: Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio – inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:

    Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave.

Na previsão da lei, a punição é ampliada de um a dois terços se quem divulgar as imagens tiver relação íntima de afeto com a vítima ou se o fim for de vingança ou humilhação.

A legislação exclui da punição a publicação de imagens feita para fins de estudo ou jornalísticos, desde que não seja identificada a pessoa.

Parlamentar não comenta 6b2724

Camila Jara manifestou-se em uma única oportunidade sobre o ocorrido.

Veja o que disse na época:

“Primeiro pensei ‘como’?, depois pensei ‘quem’ e parei no por quê?”
“Porque quando uma mulher incomoda a elite, seu corpo vira alvo e não suas ideias?”
“Por que quando uma jovem se destaca se frente a velha política, seu corpo é exposto e não o seu trabalho?”
“Por que quando a gente se atreve a mudar as coisas, o corpo é a primeira coisa que tentam para tentar nos calar”, escreveu

Postagem nas redes sociais
Post de Camila Jara sobre foto compartilhada
Post de Camila Jara sobre foto compartilhada em novembro de 2022. (Foto: redes sociais)

Depois de desvendar o resultado das apurações policiais, a Capivara Criminal tentou contato com a parlamentar para falar a respeito. A resposta foi negativa.

Camila, cogitada como pré-candidata a prefeita de Campo Grande, disse estar à disposição para entrevistas sobre seu trabalho em Brasília, mas não sobre o crime do qual foi vítima.

A assessoria jurídica dela, na pessoa do advogado João Antônio Argirin, informou que não comentaria sobre o processo por se tratar de segredo de justiça.

Proposta de novo crime 3z2f25

Na Câmara Federal, Camila Jara apresentou no ano ado um projeto para criminalizar uma nova forma de exposição do corpo de outras pessoas, por meio dos nudes fakes, que usam a tecnologia para criar imagens, muitas vezes inserindo as vítimas em cenários pornográficos. A ideia surgiu depois que alunas de uma escola no Rio de Janeiro sofrerem com esse tipo de material fake.

A proposta acrescenta ao Código Penal o artigo 216-C, que ficaria da seguinte forma:

  • Art. 216-C. Divulgar conteúdo falso sexual, por qualquer meio, com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso sem autorização da vítima:

    Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e multa.
    §1º Se o crime for praticado contra menor de idade:
    Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Outra previsão do projeto é que as plataformas digitais que reproduzirem essas imagens sejam obrigadas a excluir o conteúdo, sob pena de multa.

Com principal foco na proteção dos direitos individuais e a preservação da dignidade humana, o projeto de lei em tela coloca em evidência um dano que a sociedade vem experimentando que não apenas viola a privacidade das pessoas envolvidas, mas também pode ter implicações devastadoras para a reputação e o bem-estar emocional das vítimas.

Justificativa da proposta de lei

Nas redes sociais, a petista publicou recentemente vídeo falando da proposta. Veja abaixo:

Vídeo publicado pela deputada federal Camila Jara, em seu perfil de uma rede social. (Vídeo: Reprodução/Redes Sociais)

A palavra de quem estuda o tema 6m2t7

A Capivara Criminal procurou quem entende, de forma prática e também acadêmica, da complexidade relacionada à exposição não consentida da imagem, especialmente de mulheres, as principais atingidas. São camadas e camadas de questões, ligadas notadamente ao machismo estrutural; à violência de gênero e a conceitos arraigados na sociedade sobre a dignidade sexual feminina e a liberdade sobre os corpos.

Abaixo, você vai ver o comentário da procuradora de Justiça Ana Lara Camargo de Castro, que atuou mais de uma década na área dentro do Ministério Público, estudou sobre o tema academicamente, e é autora de livros na área (veja o currículo ao fim do texto).

“O crime de exposição íntima ou pornográfica não consentida está previsto no artigo 218-C, do Código Penal, incluído pela Lei 13.718/2018. Nesse crime – que se destina à proteção da dignidade, liberdade, privacidade e intimidade – estão previstas condutas variadas de disseminação (oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar, divulgar) de cena de sexo, nudez ou pornografia. O crime prevê causa especial de aumento de pena para relações íntimas de afeto (por exemplo, no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher da Lei 11.340/2006, a Lei Maria da Penha) ou para fim de vingança ou humilhação.

O crime de exposição íntima não exige especial fim de agir, vale dizer, não demanda motivação específica do autor, sendo que a mera disseminação não autorizada basta para a sua configuração. De igual sorte, o crime se configura ainda que a captura tenha se dado pelo autor com a ciência da vítima, ou o compartilhamento, ao âmbito relacional, tenha sido feito por ela própria a partir de selfies de sua autoria.

Os números apontam predominância de vítimas mulheres e perpetradores homens. As vítimas mais comuns são mulheres em situação de violência doméstico-familiar, por ocasião da ruptura do vínculo erótico-afetivo. A prevalência de vítimas mulheres é explicável pelo fenômeno macro da violência de gênero. Fenômeno persistente com raízes na desigualdade histórica das relações de poder entre homens e mulheres, no patriarcado, na falocracia e no machismo. Nesse sentido, a exposição é apenas mais uma forma de exercer dominação e garantir controle.

Ana Lara Camargo de Castro
Ana Lara Camargo de Castro, procuradora de Justiça do MPMS
Ana Lara Camargo de Castro, procuradora de Justiça do MPMS. (Foto: divulgação)

Muito a fazer 3l6v3l

A tipificação criminal da conduta de disseminação não autorizada de imagens íntimas é relevante para combater os estereótipos associados ao corpo e à sexualidade da mulher. E, nesse sentido, opõe-se à alastrada aceitação social da cultura do estupro e da letra escarlate de slut-shaming (estima social de promiscuidade). Não obstante, para além do Direito Penal ou Civil (absolutamente necessários nas dimensões da responsabilização e da reparação) ainda são necessários incansáveis e incalculáveis investimentos em educação transformativa.

Ana Lara Camargo de Castro

Em se tratando de vítimas crianças ou adolescentes, o crime previsto é o do artigo 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) e abarca as situações de oferecimento, troca, disponibilização, transmissão, distribuição, publicação ou divulgação na Internet de fotografia, vídeo ou outro registro contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com crianças e adolescentes, e o 241-B também define como ilícitos a aquisição e a mera posse ou armazenamento desse material.”

Quem é Ana Lara Camargo de Castro?

Procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, Master of Laws em Criminal Law, com honras, pela State University of New York, Especialista em Psicopatologia e Saúde Mental pela Unesc, Especialista em Inteligência de Estado e Inteligência de Segurança Pública com Direitos Humanos pela Fundação Escola do MPMG, licenciada em Ciências Sociais e História; formada em Psicanálise Clínica.

É autora de três livros: “Plea Bargain – Resolução Penal Pactuada nos Estados Unidos”; “Stalking e Cyberstalking e Exposição Pornográfica Não Consentida na Virtualidade”; e “Perversão, Pornografia e Sexualidade”.

Este conteúdo reflete, apenas, a opinião do colunista Capivara Criminal, e não configura o pensamento editorial do Primeira Página.

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