Capivara Criminal 232h40

A chacina de Sinop, psicopatia e armas na mão 201a4t

Episódio com 7 mortes evidencia mistura explosiva, que reúne traços de personalidade dissocial dos assassinos e o risco do armamento de fácil o 2u4x57

“Alguém que comete esse tipo de crime é naturalmente um sociopata”

Ricardo Molina, perito

“Crimes como este, de modo geral, incluem pessoas com transtorno de personalidade antissocial”

Marcos Estevão, psiquiatra

“São pessoas totalmente irrecuperáveis. É uma deformidade, que a pessoa nasce, se desenvolve com ela, e morre com ela”.

Guido Palomba, psiquiatra


As sentenças acima do vídeo são de profissionais experimentados em lidar com os aspectos mais soturnos do comportamento humano. Os três foram procurados pela Capivara Criminal para falar de traços de personalidade capazes de produzir cenas inclassificáveis, e incompreensíveis, como a da chacina ocorrida em Sinop, no Mato Grosso, no dia 21 de fevereiro.

Todos, como você leu, viram elementos de anormalidade psíquica nos atiradores. Mas atenção, é bom frisar. Neste texto, ficará claro que ter um funcionamento cerebral com “defeito” não configura motivo para eximir ou atenuar qualquer culpa ou responsabilidade penal. É, inclusive, evidência de se tratar de pessoas com impossibilidade de convivência social, diante do risco de repetir as condutas perigosas à vida alheia, tal qual na chacina em Sinop.

Era meio da tarde da terça-feira de Carnaval de 2023, quando a disputa de sinuca terminou em corpos pelo chão, de sete pessoas, entre elas uma criança de 12 anos.

Deixou a opinião pública absurdada, além da violência sem propósitos, o estopim identificado para a matança. A dupla de atiradores fuzilou quem estava no boteco porque perdeu no jogo, valendo dinheiro, e ouviu zombarias.

Eram gracejos típicos das disputas do jogo vencido por quem consegue colocar mais bolas nas caçapas da mesa forrada de verde. Mas ali, com aquelas duas pessoas armadas, terminou em episódio para nunca mais esquecer.

Causou estranheza o valor relativamente alto da aposta, de origem desconhecida. A informação obtida pela coluna foi no sentido de não haver interesse para a investigação sobre esse aspecto, por não ter relevância para a resolução do inquérito.

Sete vidas custaram R$ 4 mil, o valor apostado, e umas palavras de “zoeira”.

Nas imagens gravadas, aparecem três mesas de jogo de bilhar e, já nos primeiros segundos, um dos jogadores, de camisa azul, empunhando uma pistola, empurra o oponente, que está com um taco na mão, para o canto oposto. O plano filmado mostra outras pessoas sentadas, aparentemente observando.

Instantes depois, estão todos na parede, acuados. Começa a saraivada de tiros. Primeiro, o homem de camisa listrada com a espingarda calibre 12 na mão, que ele foi buscar no utilitário estacionado. Depois, o outro jogador derrotado.

O som de uma tevê ou rádio, ao fundo, é cortado pelos estampidos. Dura menos de um minuto e meio.

Depois da carnificina, os dois matadores ainda voltam para pegar dinheiro sobre as mesas. Fogem em uma camionete. O de azul a perto de onde está uma mulher escondida.

Das nove pessoas presentes, sobram duas vivas, um homem e uma mulher. Ele se jogou onde deu, um matagal segundo relatos posteriores; ela ficou escondida atrás de uma mesa artesanal, feita com carretel gigante, daqueles de cabos telefônicos.

O que se sabe até o momento sobre a chacina em Sinop
Edgar, com a espingarda na mão, atira contra as vítimas (Foto: reprodução de vídeo)

“Parece crime por encomenda” f3s6w

Ao ver a imagem, o perito Ricardo Molina, famoso por análises periciais de cenas de crimes polêmicos, feito a morte de PC Farias e Suzana Marcolino, logo classifica como obra de quem é sociopata.

Chega a dizer que parece cenário de crime sob encomenda.

Indagado sobre sua observação do fato de a mulher ter sido “poupada”, avalia que foi pura “sorte”.

Elementos comuns a psicopatas k662s

O psiquiatra Marcos Estevão, especialista na área forense, enxerga no material registrado em vídeo, e nas circunstâncias já apuradas, elementos típicos de crimes cometidos por pessoas com personalidade dissocial. Esse é o nome mais técnico para o que a maioria entende por psicopata.

“Eles vêm, sem nenhum sentimento de culpa, sem nenhum grau moral em relação a aquilo, e matam as pessoas que ali estão, de qualquer idade”, pontua.

 “Depois de efetuar essa matança, saem percorrendo o local, tirando objetos ou coisas parecidas, mostrando que aquilo faz parte do cortejo criminal deles. Quando não existe desespero pelo ato praticado, quando existe uma premeditação, e um requinte de crueldade – fazendo com todas as pessoas que estão ali, indistintamente, de qualquer idade, pelo simples fato de alguma agressão anterior –  isso já mostra um comportamento de alteração de personalidade”

Marcos estevão, psiquiatra

Ao fim das palavras, o médico alerta sobre a necessidade de, para identificar uma anormalidade, fazer perícias específicas. Cita ainda, a possibilidade de interferência de substâncias como álcool ou outro tipo de droga, facilitadores de comportamentos do tipo.

“São pessoas que têm os valores morais, éticos, muito reduzidos. Não têm aquilo que se chama sentimento, chamamos de hipoafetivos, por isso agem dessa maneira”, afirma à coluna um dos psiquiatras forenses mais conhecidos no país, Guido Palomba.

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Guido Palomba. (Foto: Associação Paulista de Medicina)

Depois de assistir a cena sem edição, Palomba comenta que diante da repercussão do caso, tinha visto as imagens, de forma mais sucinta.

Vendo o episódio sem cortes, para ele, está nítido: “Pessoas normais não praticam esse tipo de ato”. Gente assim, explica, não muda, nem tem tratamento.

“Eles nascem assim, crescem assim, e morrem assim”.

Limiar baixo para frustração 26672h

Tanto Estevão quanto Guido Palomba citam como presentes no fato a característica do limiar baixo para frustração dos atiradores. É item comum nos perfis de matadores em série.

“Houve uma perda, não toleram a perda, não toleraram a brincadeira. Essa baixa tolerância, associada a uma personalidade dissocial, fez com que eles fossem buscar algo que pudesse ser dado em troca, no caso a própria agressividade, algo maior que a zombaria do outro, no caso o poder da arma de fogo, que hoje é muito facilitada, e cria essas possibilidades”, analisa Marcos Estevão.

Marcos Estevão, psiquiatra

Palomba acrescenta não bastar ter baixo limite de tolerância quando se é desagradado. É preciso também carregar espécie de “potência” para agir de forma tão extrema.

Sob essa ótica, explana o médico, o ambiente faz muita diferença. Ele responde isso quando a Capivara Criminal faz referência aos últimos anos de ânimos acirrados na sociedade, com embates sobre regras para liberação e controle do uso de armamentos.

“Nas pessoas que têm essa potência, que carregam essa potência, claro que tudo isso, essa animosidade social exarcerbada, ela funciona como fator desencadeador”, assevera.

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E se não tivessem arma? 1t4p70

Num exercício de imaginação proposto, Guido Palomba e a Capivara Criminal chegam, juntos, à hipótese de uma situação bem diferente, se não houvesse armamento à mão dos assassinos de Sinop.

Haveria xingamentos, até algum tipo de violência física, mas não execuções à queima roupa, até mesmo de uma criança, entende o psiquiatra.

Nesse ponto, ele faz a ressalva de estar falando do ponto de vista da experiência da Medicina em relação ao comportamento humano quando está com um equipamento bélico.

“Arma não deveria nunca ser facilitada para civis”, declara. Continua dizendo que o armamento tem serventia para duas coisas; “para policial, ou para bandido”.

“Salvo alguns poucos, reduzidíssimos atiradores esportistas”, excetua.

Quando lembrado que um dos matadores da chacina de Sinop tinha registro como CAC (Colecionador, Atirador e Caçador), Palomba amplia o tom crítico a regras flexíveis para o armamento da população.

“Os exames que se faz para regularizar a arma a um civil não têm valor nenhum, os médicos peritos estão cansados de examinar homicidas que foram aprovados nesses testes”, comenta.

“Pessoas com personalidades anormais, com pavis curtos como esses da cena em Sinop, que agem em curto-circuito, os exames não pegam nunca”.

Como a sociedade pode se proteger? 7331r

Para o psiquiatra forense, uma das medidas é a restrição máxima à oferta de material bélico fora do ambiente das forças de segurança. Nessa seara, prossegue, o controle deve ser máximo, incluindo reprovação de quem apresenta problemas ou não tem controle emocional para lidar com o fato de estar munido de insumo letal.

Quanto a quem comete crimes, e tem personalidade dissocial identificada, o caminho, afirma, é a punição rigorosa, no mais alto patamar, sem direito a atenuantes.

Perigosos para sempre 693o

“O fato de ter uma personalidade psicopática, não diminui, nem isenta em nada em temos de imputabilidade”, decreta. “Ao contrário, acrescenta um alto grau de periculosidade”, emenda.

Indivíduos assim, explicaram os especialistas e fontes policiais e do judiciário ouvidas pela coluna, sabem ter feito algo reprovável. Diante disso, não é aplicável contra elas a tese de terem agido fora de suas faculdades mentais. Não se trata de incapazes.

Dos dois atiradores, Ezequias Souza Ribeiro, de 27 anos, foi morto pela Polícia Militar. O outro, Edgar Ricardo de Oliveira, se entregou.

Ambos tinham histórico policial. Ezequias tem ficha mais extensa, com registros por roubo, formação de quadrilha e ainda um processo na área ambiental, por transportar madeira sem autorização. Em seu nome, aparecem empresas madeireiras.

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Edgar Ricardo, de cabeça baixa, ao ser preso. No detalhe, fotos publicada na internet. (Foto: TV Centro-América/ redes sociais)

Edgar Ricardo Oliveira, 30 anos, chegou a responder questionamentos de jornalistas quando chegava à delegacia.

Num vídeo em circulação na internet, afirma que quis poupar a vida da sobrevivente. E que “não era para ter atingido” a criança. Nas redes sociais, ele se apresentava como empresário da área da construção civil.

Sobre as outras vítimas, nenhuma declaração. Na ficha dele, há registro de violência doméstica.

Edgar vai responder por sete homicídios, qualificados por motivo fútil, torpe, por recurso que dificultou a defesa das vítimas e, ainda, por ter atingido menor de 14 anos.

Considerando os tipos penais, pode pegar mais de duas centenas de anos de reclusão como pena.

Procurada, a defesa de Edgar disse não ter avaliado o uso da tese de insanidade mental.

Diante do risco para a integridade do preso, ele foi custodiado em cela de segurança, na PCE (Penitenciária Central do Estado), considerada a mais rígida de Mato Grosso.

Este conteúdo reflete, apenas, a opinião do colunista Capivara Criminal, e não configura o pensamento editorial do Primeira Página.

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