Autismo – Um mundo só seu q2j33
Carlos e Maria sabiam que existia algo errado com João Pedro. Ele não desenvolvia como Antônio Augusto, seu irmão dois anos mais velho. João havia completado três anos de idade e não falava uma só palavra, apenas balbuciava e apontava para coisas que pretendia ter. Irritava-se quando não era compreendido e aborrecia-se mais ainda com […] 17b3i
Carlos e Maria sabiam que existia algo errado com João Pedro. Ele não desenvolvia como Antônio Augusto, seu irmão dois anos mais velho. João havia completado três anos de idade e não falava uma só palavra, apenas balbuciava e apontava para coisas que pretendia ter. Irritava-se quando não era compreendido e aborrecia-se mais ainda com certos barulhos que vinham de dentro ou de fora de casa.

O trânsito era infernal em sua rua e os motociclistas avam a toda velocidade com suas motos barulhentas, fato que aborrecia muito João Pedro. O ventilador antigo de casa teve que ser substituído por um novo e silencioso, tal o descontentamento que o antigo causava ao menino, apesar de que as hélices do ventilador pareciam hipnotizá-lo, quando rodavam, assim como os pneus dos carros que avam na frente de sua casa.
O menino mexia frequentemente as mãos de baixo para cima e de cima para baixo como se estivesse abanando algo ou a si próprio. Escolhia sempre os mesmos objetos para brincar e não se dava bem com nenhum tipo de mudança, como a arrumação de seus brinquedos ou do seu quarto. Irritava-se com facilidade e não tolerava ser contrariado. A palavra “Não” era apenas dele e não para ele. Muitas vezes chegava a ficar agressivo quando um “Não” lhe era dirigido.
Chegara a hora de iniciar a escola, o que parecia não haver possibilidade naquele momento, ele certamente não ficaria no colégio e caso fosse obrigado a isso, provavelmente iria agitar-se demais. Resolveram acatar a indicação que o pediatra vinha fazendo há algum tempo de levar a criança para avaliação de um psiquiatra infantil. Assim o fizeram e este constatou o que o pediatra já vinha sinalizando, o garoto estava inserido no transtorno do espectro autista (TEA). João Pedro ou então a cuidados de diversas especialidades médicas e não médicas: pediatria, psiquiatria infantil, neuropediatra, psicologia, terapia ocupacional e fonoaudiologia.
Aos sete anos de idade, ele já articulava um vocabulário de um número considerável de palavras, mas respondia as perguntas, repetindo os vocábulos usados pelos seus interlocutores, sem fazer contato olho a olho. O menino parecia ter seu próprio mundo, nem mesmo prestava atenção quando falavam dele. Até quando o chamavam pelo nome, não parecia ser com ele que queriam falar. Vivia alheio e indiferente às pessoas que estavam a sua proximidade. Brincava sozinho, enfileirava seus brinquedos, apegava-se fortemente a eles e tinha dificuldade para aceitar brinquedos novos.
Hoje é pré-adolescente e praticamente com as mesmas características de antes, não possui amigos, porque tem dificuldade de socializar-se. É bem verdade que melhorou em alguns aspectos, perdeu em parte a agressividade, hoje tem um pouco mais de tolerância, se compararmos ao seu período infantil.
O autismo apresenta diferentes graus clínicos. Quando severo, há necessidade de maior apoio familiar e profissional, geralmente com necessidade de uso de medicamento para controlar o comportamento e o sono. O grau leve permite ao autista levar uma vida relativamente normal, havendo condições de concluir um curso superior, exercer uma profissão e constituir família. Quando o grau é moderado, tenta-se conseguir todos os ganhos alcançados no grau leve, mas muitas vezes isso não é possível. Há ainda a Síndrome de Asperger, incluída no espectro autista, com manutenção das habilidades cognitivas, muitas vezes acima da média geral da população, que deixaremos para falar numa próxima oportunidade.
A legislação brasileira assegura direito ao autista e seus familiares. A Lei Berenice Piana (12.764/12), instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, reconhecendo o autismo como deficiência, com vários direitos, dentre eles a inclusão em escola regular. A Lei 13.370/2016 garante a diminuição da jornada de trabalho dos pais de autista. Além dessas, há outras Leis, como a Lei 8.742/93 (Direito à prestação continuada); Lei 8.899/94 (transporte gratuito com acompanhante); Lei 10.048/2000 (atendimento prioritário); Lei 13.977/2020 (carteira de identificação). Todas elas beneficiam o portador de TEA e seus familiares.
Em relação à saúde, é importante o diagnóstico precoce, ainda na infância, para que se consiga um melhor prognóstico. Sabe-se que a aquisição de palavras e a comunicação incentivadas o mais cedo possível e o êxito na obtenção destes objetivos melhora muito o prognóstico.
O autismo não tem cura, mas a abordagem multidisciplinar precoce pode gerar melhor qualidade de vida aos portadores desta patologia. A família, a escola e o pediatra são os que mais rapidamente observam sinais da enfermidade nos pequeninos. Com a suspeita de TEA, há de se proceder às avaliações especializadas em busca da certeza do diagnóstico e início do tratamento.