Crise climática intensifica vulnerabilidades de pessoas com deficiências em MT 1v5u2z

Pessoas com deficiência visual têm dificuldades adicionais em se orientar e ar informações em momentos críticos, como diante de desastres ambientais 76d64

Não importa onde você esteja, as mudanças climáticas afetam a vida de todas as pessoas. E, mesmo sendo uma preocupação global, as consequências delas atingem a população de forma diferente. Além de serem mais sentidas pelos grupos sociais mais pobres, as pessoas com deficiências têm vulnerabilidades intensificadas. Situação que é apontada por um estudo da UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso).

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Pessoas com deficiências visuais têm vulnerabilidades intensificadas com crise climática. | Descrição: foto mostra pernas e pessoa com deficiência e uma bengala. (Foto: Reprodução)
Escute a reportagem com audiodescrição.

Esse grupo enfrenta desafios significativos quando se trata de lidar com esses impactos, que incluem desde a elevação do nível do mar, aumento de desastres naturais, ondas de calor intensas e secas prolongadas, até o aumento de doenças relacionadas ao clima, como asma e alergias.

Pessoas com deficiência física podem enfrentar, por exemplo, dificuldades adicionais para se protegerem em situações de emergência, como evacuação e resgate. Já as pessoas com deficiência visual podem ter dificuldade em se orientar e ar informações em momentos críticos, enquanto as pessoas com deficiência auditiva podem ter dificuldade em receber alertas e orientações sonoras.

Essa percepção é sentida por Odenilton Júnior, que é deficiente visual e atua como analista de e em Cuiabá. Para ele, uma das principais preocupações em relação às mudanças climáticas é a falta de preparação e inclusão das pessoas com deficiência visual em planos de resposta a desastres ambientais.

Pessoa com deficiencia visual
Odenilton Junior relata sobre desafios enfrentados. | Descrição: na imagem, Odenilton, homem negro deficiente visual trabalhando sentado em frente a um notebook. (Foto: Câmara de Cuiabá)

“Acredito que é muito importante começar pela identificação das regiões com maior grau de riscos, das pessoas que vivem nesses locais, treinamentos de preparação para lidar com desastres e principalmente com desenvolvimento de um sistema de comunicação preciso e eficiente. Evidentemente, se estamos falando de pessoas com deficiência, a ibilidade e a perspectiva inclusiva são fundamentais para orientar todas essas ações”, afirma.

Pensando nessa realidade, um estudo publicado na revista científica International Journal of Disaster Risk Science em 2022, investigou as vulnerabilidades que a população cega ou com baixa visão enfrenta diante de desastres ambientais.

O artigo, nomeado como “(In)visibilidades sobre as Vulnerabilidades das Pessoas com Deficiência Visual aos Desastres e Mudanças Climáticas” foi produzido por cientistas do GPEA (Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte) da UFMT.

Seca Cerrado Agencia Brasil
Seca no cerrado brasileiro também pode ser efeito de mudanças climáticas. | Descrição: foto mostra seca no cerrado brasileiro com várias árvores sem folhas e ao fundo algumas com folhas verdes. (Foto: Agência Brasil)

Segundo a bióloga Giselly Gomes, autora da tese de doutorado que embasa o estudo, as pessoas com deficiência visual são afetadas pela falta de programas e iniciativas educacionais sobre meio ambiente, bem como pela ausência de planos de ação e políticas públicas voltadas para esta população em caso de desastres.

O estudo ressalta que é necessário incluir materiais em áudio, Braille e outros formatos íveis para que essas pessoas tenham o às informações e possam se preparar adequadamente para desastres naturais. Além disso, é preciso garantir que as instalações de emergência sejam íveis e que haja um plano de evacuação inclusivo que atenda às necessidades de todas as pessoas.

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Segundo a autora da pesquisa, indivíduos com deficiência visual e baixa renda são particularmente suscetíveis às consequências desses eventos catastróficos. “Neste contexto, a pesquisa evidencia que as pessoas com deficiência visual e de baixa renda são particularmente vulneráveis, tendo que lidar com uma dupla vulnerabilidade”, afirma.

A vulnerabilidade multiplicada enfrentada por alguns grupos sociais diante das mudanças climáticas tem sido tema de estudo de diversos pesquisadores no Brasil e no mundo. O conceito tem recebido o nome de justiça climática e parte do entendimento de que, ainda que as mudanças climáticas sejam uma realidade global, suas consequências impactam a população de forma desigual.

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Enchentes nas capitais afetam população. | Descrição: foto mostra pessoas andando por uma rua alagada em um área urbana. (Foto: Agência Brasil)

É o que explica Michèle Sato, pesquisadora da UFMT e coordenadora do GPEA, que desenvolve estudos relacionados à Justiça Climática e Educação Ambiental. “Não são os ricos que vão sofrer mais, em 90% das vezes são os pobres. Nós vimos isso na pandemia, que atingiu todo mundo, mas foram os mais pobres que mais morreram, por falta de o a médicos, ou remédios, a hospitais”, explica. 

Michele Sato
Na imagem, a professora Michèle Sato, uma mulher de descendência asiática, aparece sorrindo de forma contida. Ela está em pé, tem um cabelo curto e uma blusa na cor preta. (Foto: Safira Campos)

“A esse fenômeno – causado pela desigualdade – nós chamamos de injustiça climática. Porque os pobres são geralmente os que menos emitem gases de efeito estufa. Geralmente são os ricos que emitem mais esses gases que fazem o efeito do aquecimento global, mas são os mais pobres que sofrem com as consequências”, detalha a pesquisadora. 

Inclusão no debate 3r3043

Embora tenham sido alcançados avanços significativos na legislação, pessoas com deficiência visual ainda enfrentam obstáculos que prejudicam sua inclusão social em diferentes contextos. A luta pela inclusão em debates sobre crise climática é um exemplo disso, já que pessoas com deficiência são excluídas das discussões sobre o assunto e não possuem o a informações e recursos importantes para se preparar e se adaptar às mudanças climáticas.

Quando questionado sobre a preparação para casos de desastres ambientais, Odenilton Júnior itiu que nunca participou de treinamentos ou ações preparatórias, mas acredita que essas medidas são essenciais para comunidades em risco. Ele também destacou a importância da ibilidade e da perspectiva inclusiva na preparação e resposta a desastres ambientais, especialmente para pessoas com deficiência. “Recursos como Libras e audiodescrição devem ser obrigatórios em todos os processos, e é necessário considerar a perspectiva inclusiva em todas as ações”, afirma.

Em Mato Grosso, estado que vem sofrendo com a intensificação de eventos climáticos extremos, como secas prolongadas e enchentes, não há nenhuma política pública voltada à prevenção e socorro de pessoas com deficiência em casos de desastres causados pela crise climática, de acordo com Conede (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência). 

Procurada pela equipe de redação, a Setasc (Secretaria de Assistência Social e Cidadania do Estado de Mato Grosso) se limitou a informar, por meio de nota, “que os primeiros atendimentos em situação de desastres naturais e de calamidade pública, são de responsabilidade da Defesa Civil do Estado de Mato Grosso”. Ainda de acordo com a nota, “a Setasc acompanha as ações da Defesa Civil e auxilia famílias que precisam de alimentos, com o fornecimento de cestas básicas, de cobertores e de filtros de barro”. Nada é pensado diretamente para pessoas com deficiência. 

De acordo com Giselly, é urgente que as pessoas com deficiência sejam ouvidas e participem efetivamente dos espaços de decisão. E que tenham o, por meio de planos educacionais, a discussões sobre meio ambiente e riscos de desastres.

“As pessoas com deficiência visual são as que que melhor entendem suas próprias barreiras e sua inclusão no debate fazem com que o tema seja contemplado de maneira mais ampla. Nenhuma política que diga respeito a essas pessoas deveria ser decidida sem a sua plena participação”, afirma. 

Um longo caminho pela frente i6u6w

Mesmo diante do atraso na tomada de decisão, já há sinais de progresso. Em 2015, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência reconheceu que as pessoas com deficiência são especialmente vulneráveis às mudanças climáticas e exige que as políticas de adaptação e mitigação levem em consideração as suas necessidades e capacidades. Além disso, a inclusão das pessoas com deficiência nas discussões sobre justiça climática está se tornando cada vez mais comum em fóruns internacionais e eventos.

No Brasil, a Lei de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) estabelece que é dever do Estado promover a ibilidade e a inclusão das pessoas com deficiência em todos os setores da sociedade, incluindo o meio ambiente e a adaptação às mudanças climáticas. Além disso, o Plano Nacional sobre Mudança do Clima, de 2016, também prevê a inclusão das pessoas com deficiência em suas estratégias e medidas de adaptação e mitigação das mudanças climáticas.

Ainda há, entretanto, muito trabalho a ser feito para garantir que as pessoas com deficiência visual estejam incluídas nas políticas e programas de adaptação às mudanças climáticas.

Como Odenilton destaca, é preciso garantir que mais grupos sejam incluídos em discussões dessa natureza. A justiça climática só será alcançada quando todas as experiências, incluindo as das pessoas com deficiência, forem consideradas nas decisões sobre o futuro do planeta.

*Este conteúdo foi produzido com apoio do programa Jornalismo e Território, da Énois Laboratório de Jornalismo. Para saber mais, e www.enoisconteudo.com.br ou @enoisconteudo nas redes sociais.

** Este conteúdo foi produzido em colaboração com Safira Campos, repórter do portal de notícias PNB Online.

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