Em casa fechada na Afonso Pena, relíquias contam história de MS 3i3g66
Em área nobre da cidade, morava Lélia de Figueiredo, filha de Arnaldo Estêvão de Figueiredo; ali, fotografias, obras de arte e documentos foram encontrados r3e2l
Na principal avenida de Campo Grande um verdadeiro tesouro histórico se escondia em uma das casas desabitadas da Afonso Pena. Em pleno Centro, a construção que um dia foi da família de Arnaldo Estêvão de Figueiredo, até esta semana, ainda guardava quadros, fotos e documentos que ajudam a contar sobre a construção da capital de Mato Grosso do Sul e do próprio estado.

A história da recuperação de dezenas de documentos começa de maneira inusitada. Foi por mensagens de um conhecido que Wantuyr Tartari, superintendente de turismo da Sectur (Secretaria de Cultura e Turismo de Campo Grande), descobriu que dentro da mansão – invadida dias antes por moradores em situação de rua – havia em verdadeiro acervo histórico.
A primeira informação era de que ali, havia morado uma senhora chamada Lélia, conhecida na cidade. O nome logo veio a mente de Wantuyr; Lélia Rita Euterpe de Figueiredo Ribeiro, filha do ex-prefeito de Campo Grande e ex-governador de Mato Grosso, quando os dois estados ainda eram um só.
Dona da cadeira de número 27 da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras, fotógrafa e escritora, Lélia dedicou a vida a cultura e a arte de Mato Grosso do Sul e em Campo Grande, fundou a Casa da Memória Arnaldo Estevão de Figueiredo, museu que por anos funcionou na avenida Calógeras, mas fechou em 2006.
A ligação foi imediata, o que havia dentro da mansão era parte do acervo que um dia formou a Casa da Memória. Começou então a busca pelos donos da casa e pela família Figueiredo.


Lélia morreu em 2020, vítima da covid-19 e depois que ela se foi, os filhos venderam o terreno na Afonso Pena. Antes que ele fosse novamente ocupado, no entanto, o destino quis que todo o acervo ganhasse um novo dono: a própria Campo Grande.
“Pedimos autorização para a nova proprietária para entrar na casa e os herdeiros da Lélia também autorizaram que a gente recolhesse o material”, explica o surpreendente de turismo. No começo da semana, as equipes do Arca (Arquivo Histórico de Campo Grande) entraram em ação.
Aos poucos, o tesouro guardado ali foi sendo descoberto; como conta Joelma Arguelho, gerente de patrimônio cultural de Campo Grande.
“Ficamos impressionados. Houve uma invasão. Os moradores em situação de rua levaram metais, as maçanetas das portas, as fiações elétricas, tudo que eles imaginam que tenha um valor comercial, eles pegaram. Mas nós somos atrás do acervo documental. Lá na casa nos deparamos com muitos documentos históricos. Tinha desde cartas, manuscritos, agendas, documentos, fotografias, negativos de foto, mapas, telas, um acervo bem extenso, inclusive a placa da Casa Memória, que deve ter sido usada na inauguração”.
Tudo o que podia ser documento histórico foi levado pela equipe para o arquivo histórico. Agora, explica Joelma, um processo mais detalhado começa a ser feito; a separação do que tem potencial para fazer parte do acervo da capital ou não.
“Agora vamos começar a organização, depois a qualificação, depois tudo vai ar por uma avaliação do estado de conservação. As vezes têm documentos que precisa de restauração parcial, outros, total. Encontramos imagens sacras, alguns santinhos sem cabeça, então precisamos fazer essa restauração”, explica.
No Arca, o cuidado vai além da restauração, é importante também o condicionamento dos documentos e das obras de artes, tudo pensado na melhor maneira de conservar a história contida em cada peça.

Na mansão, muitos livros foram encontrados e agora, parte deles, vão compor a Biblioteca Pública Municipal. Tudo vai ser disponibilizado para a população e vai servir de e a pesquisa, para a construção da memória de Campo Grande e do Mato Grosso do Sul.
“Recuperar e ter o aos documentos e alguns objetos que fizeram parte da história da construção do lugar onde vivemos, significa preservar a tradição daqueles que contribuíram para que chegássemos ao ponto em que nos encontramos. Trata-se de uma oportunidade única para compreender, inclusive, a nossa própria identidade”
Wantuyr Tartari
superintendente de turismo da Sectur
Hoje, qualquer pessoa que possui objetos históricos, livros ou documentos, podem doar o acervo ao Arca. O gesto simples, ajuda a preservar não só a memória, mas a história de personagens que ajudaram a construir Mato Grosso do Sul.
“A gente não gosta muito de usar a palavra resgate. Mas fiquei pensando. Que palavra seria ideal para tudo isso, se não resgatar, no mesmo sentido de um bombeiro que vai lá e resgata e salva. Saímos um pouco desse sentimento, que a gente realmente fez o resgate desse material”, detalhou Joelma.